Vira e mexe as ostras desfilam pela calçada da praia do Bogari, calçando sapatos coloridos, como se nunca tivessem sido colhidas pelos meus apetrechos de pesca nos arrecifes. Quando tal acontece, quase sempre, remexem no meu antigo baú. São meus espantos guardados, sem chave, justo quando finjo não pensar em nada. As ostras giram o tronco em minha direção e, solícito, digo-lhes que se acomodem ao meu lado, no banco de areia da praia. Sentadas, me falam do que viram e ouviram, quando presas nas formações rochosas, próximas à costa, tornando-se muitas vezes cúmplices de algumas histórias. E ficamos, então, eu e elas, sob um céu estrelado,
à beira de outro instante. No meu íntimo, uma estranha magia. A casa dos meus pais, a poucos
passos. É do útero do tempo que elas ressurgem, que brotam. A pele arrepia, a
alma cintila. E as ostras passam, ficam e se fincam em mim, pois, ainda que mortiça, trazem sempre uma claridade, como se fosse a luz de uma vela. Pedaços de saudades da ponta do mar, da península de ontem, cirandas de histórias que nunca chegam ao fim, um show
de vaga-lumes por todos lados que estilhaçam o ar, abrem o armário e vão aquecendo, sem pressa, as esquecidas paredes da memória. Aproveito a lassidão que nos acolhe e vou também abrindo os olhos, as mãos, o corpo, enquanto elas parecem dizer-me que já não preciso correr contra o relógio. Contra o tempo. Aquecidas, as ostras ensaiam uma canção praieira do Caymmi para a noite que avança madrugada a dentro. Suspiram e se afastam. Não consigo desviar meu olhar dos moluscos que se distanciam lentamente, tampouco me ocorre o que ainda queria dizer...
(José Carlos Sant Anna)
(José Carlos Sant Anna)
E das ostras saiu esta pérola de texto. "Pedaços de saudades da ponta do mar, da península de ontem…" Você, meu Amigo José Carlos tem uma imagética fantástica, de "estranha magia"... Lê-lo é um gosto enorme.
ResponderExcluirUm beijo.
"E ficamos, então, eu e elas, sob um céu estrelado, à beira de outro instante. "
ResponderExcluirE assim nascem novas histórias que cirandam por aí. Gostosas de ler.
Beijos, José Carlos.
São ostras duvidosas... segundo a pesquisa que acabei de fazer,
ResponderExcluirBogari é uma praia imprópria para banhos...
Boa para recordar as ostras... rrrsssss.
Grata pelos bons momentos de leitura.
Abraço, Amigo
~~~
Olá, professor (rs)!
ResponderExcluirOlha, essa história de ostras quase me matou em Floripa, quando na casa de amigos fui obrigada a comer esse molusco de águas marinhas...para não fazer desfeita ao anfitrião que se gabava muito de sua culinária. Mas José Carlos, que coisa pavorosa! Não creio que eu possa vir a fazer as pazes com ostras, talvez só em histórias, contos escritos que me dão satisfação em ler. Histórias contadas muito bem por você, aí sim.Caso contrário...distância!
Beijo, um bom feriadão pra você!
¡Ostrsas!!!
ResponderExcluirJosé-Carlos, mandame unas pocas!!! Me encantan.
Y son muy almenticias.
Bello relato sobre morusco.
Un beso.
José Carlos, caro amigo
ResponderExcluirvocê é de "culinária" sofisticada sem deixar perder, contudo, o gosto natural dos alimentos
essas ostras a bambalearem-se na praia estão mesmo a pedir champanhe, reconheça! eu sei que a vida não vai fácil em todo o Mundo, mas - com os diabos! - um dia não são dias e essas ostras merecem o melhor...
excelente, teu talento é inigualável José Carlos Sant Anna
forte abraço, meu amigo
Olá José Carlos!
ResponderExcluirNunca pensei que as ostras fossem tão fuxiqueiras! rsrs
Bom saber!
Beijos
Ah José Carlos, que pena que cheguei atrasada para o banquete risos.
ResponderExcluirAdorei ler o texto, muito bom. Dizem que a ostra possui uma frescor ímpar, uma consistência notável, um perfume sutil e um sabor único. Isso eu posso até concordar, mas prefiro um peixe na minha mesa risos.
Um abraço, um sorriso e um excelente mês de novembro.
Precisei me ausentar devido viagem de urgência, mas estou de volta. Tem nova postagem.
Escrevinhados da Vida
Faço minhas, as palavras da Graça... das ostras... saiu esta pérola maravilhosa... em forma de prosa...
ResponderExcluirGrata, por partilhar esta magia poética... e musical, José Carlos...
Finalmente, passando por aqui, pela sua casa... já entrando... e com os pés ainda, cheios de areia... também ainda lá do meu canto, à beira mar... que sempre me deixa imensas saudades... pelo que foi muito bom, vir aqui... e continuar a respirar... o mesmo ar...
E vou então espreitar de seguida, o que mais recentemente, andei então perdendo, por aqui, durante estas minhas semanas de ausência!...
Beijinhos
Ana
José Carlos, meu amigo
ResponderExcluirTexto fascinante, encantador!!...
Aquela obra de arte irretocável, que alcança o tom
perfeito na explosão dos olhos numa imensa
admiração, que as palavras foram soberanas na
sua Arte expressiva...
Bravo!
Adorei a escolha musical no tom perfeito para
o texto...
Bjos.
Ps: Respondendo, tu tens razão, um país como nosso,
sem o programa mais médicos e com o "Mausonario"
no cargo de presidente, ninguém merece!!...